
O patriotismo não é ideologia nem doutrina; é um sentimento sem o qual a sociedade, as instituições e o Estado carecem de significado. Tão habituados às "desconstruções" dos camartelos do marxismo - que tudo reduziu a "alienações" e interesses de classe - e do mais prosaico capitalismo - que procedeu à dedução do sentido da vida colectiva pelo "bem-estar" e consumo - espantamo-nos perante a natural intervenção do Estado no fomento do patriotismo. Sim, a verdade - ericem-se os "jovens da geração de 68", que andaram décadas a apedrejar os símbolos nacionais - é que sem patriotismo não há nem civismo nem cidadania. Percorri os bancos do liceu e da universidade recebendo verdadeiras barrelas de anti-portuguesismo. Hoje, o patriotismo português está confinado ao esférico e os governantes não sabem como recuperar a unidade, pois o patriotismo é como uma liturgia: se não se celebrar diariamente, se não for permanentemente regado e inculcado, desaparece. E o que fica do irreparável vazio desse poderoso elemento agregador ? Governantes sem autoridade, o Estado sem finalidade, cidadãos de coisa alguma. O patriotismo não é de esquerda nem de direita: é nacional.


Tocou o telefone e um amigo meu, que trabalha para o governo tailandês, convidava-me para a inauguração de uma exposição que marca o início de um vasto ciclo de iniciativas que em boa hora o governo desencadeou para exaltar os símbolos nacionais. Vesti-me à pressa e à hora combinada cheguei ao local do arranque da campanha. O vice primeiro-ministro acabara de chegar e uma multidão de jornalistas disparava girândulas de flashes. Simples, com a grandeza de tudo quanto dispensa apresentações, deu-se início à sessão. Uma procissão das bandeiras nacionais da Tailândia empunhadas por jovens das escolas secundárias da capital, desfilou com solenidade exibindo o friso das bandeiras deste reino, dos tempos de Sukhothai e Ayutthaya à presente era de Banguecoque. Marchas patrióticas, cantadas por uma rapariga de vibrante voz, explicavam a sucessão das batalhas e guerras que fizeram deste país, velho de 800 anos, um rematado sucesso de sobrevivência e liberdade.



Os jovens aprendem na escola, do infantário à universidade, tudo o que os distingue dos outros. Sim, patriotismo quer dizer orgulho, pertença, diferença e disso não se envergonham os thais, que levam a extremos a sua singularidade sem que tal se exprima pela retórica do belicismo e do ódio contra o estrangeiro. Nas escolas há actividades patrióticas, o curriculo escolar inscreve-as como disciplinas obrigatórias e quem não souber a complexa trama de símbolos, bandeiras, pavilhões e flâmulas - da Casa Real, do governo, dos ministérios, das províncias e das Forças Armadas - , bem como os hinos, marchas e textos mais representativos da história de heróis e heroínas não passa ! No fundo, o patriotismo é mais importante que a aritmética, justifica a gramática e a literatura, dá substância à História e à Geografia, abre passo à preservação da natureza, da fauna e da flora. Depois, a Tailândia é uma monarquia budista. É, também, uma democracia, e se isso quer dizer "soberania popular", o povo só tem significado se for protagonista de uma vontade colectiva que ultrapassa as gerações. Explica-se, assim, o triunfo sobre o comunismo nos anos 60 e 70 e, recentemente, o estrepitoso fracasso da conjura plutocrática-mundialista que quase atingiu os seus objectivos.

