Saturday, May 19, 2012

A voz nunca morre


Imagina o leitor se morressem de uma assentada todos os actores, todos os cantores populares e líricos, os instrumentistas, jornalistas, locutores e escritores, pintores e arquitectos, tradutores, cineastas, mais os estilistas, os empresários das artes e do espectáculo ? Pois, foi isso que aconteceu no Camboja de Pol Pot. Em Phnom Penh, ouve-se aqui e ali, nos cafés e restaurantes, nas tendas dos mercados uma voz masculina cantando velhas cançonetas românticas do tempo do nosso yé-yé. Perguntei a um khmer de quem era essa voz. Respondeu-me, visivelmente emocionado e com uma ponta de indignação pela minha ignorância: "é o nosso Sinn Sisamouth". Pensei que estivesse vivo e insisti: "deve ser um homem idoso". O meu interlocutor disse que não, que Sin era sempre jovem. Ao chegar ao hotel, consultei a internet. Sin foi morto, como todos os artistas, pelo governo genocida de Pol Pot e do Partido Comunista do Kampuchea, o tal que a França e a Suécia reconheceram como o legítimo representante do socialismo e da liberdade. O khmer que teve a paciência de me explicar quem era Sin tinha razão. A música nunca morre. Pol Pot está morto, Sin Sisamouth não morreu, pois continua presente em todas as casas.